O filme do cineasta
Karin Aïnouz,
conhecido pelos filmes
O Céu de Suely e
Madame Satã, premiado no Festival do
Rio, este diretor em entrevista falou da sua vontade antiga de filmar uma
história de amor falando de abandono e seus desdobramentos, inspirado na canção
de Chico Buarque ¨
Olhos nos olhos¨, onde o próprio diretor comenta o quanto
esta música sempre o perturbou a tal ponto de amadurecer este filme com
praticamente um personagem, e só iniciou o filme quando a atriz Alessandra
Negrini aceitou o papel, pois só conseguia enxergá-la neste personagem sofrido
e vibrante.
"Quando você me deixou, meu bem, me disse para ser feliz e passar
bem / Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci, mas depois, como era de costume,
obedeci / Quando você me quiser rever já vai me encontrar refeita, pode crer /
Olhos nos olhos, quero ver o que você faz / Ao sentir que sem você eu passo bem
demais.¨
O filme conta a história de
Violeta, dentista de 40 anos, que leva uma vida ¨segura¨ entre o trabalho, a
vida no lar com marido, e na ida a academia descobre pelo celular que seu
marido a abandonou sem aviso prévio, com filho adolescente e apartamento
recém-mobiliado em Copacabana. Sem chão, com a vida desmoronada, totalmente
desnorteada, percorre as ruas de bike, onde ocorre um incidente com um carro,
que no susto a leva ao chão, numa demonstração que a vida é feita de surpresas
inesperadas, quando pensamos que temos controle sobre nossas vidas (como ela
como dentista tinha sobre seus pacientes), nos sentimos frágeis ao sermos
atingidas por uma sombra , como se perdêssemos o chão.
Neste abandono e desespero de amor a
personagem desmonta totalmente, ela percorre as ruas do Rio, boates, vai ao
aeroporto tentar encontrar o marido em Porto Alegre, e encontra uma menina e
seu pai que passam pelo mesmo processo de abandono e ainda sem casa para morar,
o que torna-se para ela um aprendizado e auto-conhecimento.O filme segue
praticamente em 3 etapas, o impacto da descoberta e busca do marido, o luto da
perda e a convivência da solidão e finalmente aceitar o que a vida lhe oferece
a partir daquele ponto final. É um drama intimo onde tem poucas falas e muita
expressão , onde o som do mar, do radio do táxi, de obras na rua, do trânsito é
uma das características marcantes, como a sugerir o estado emocional de
Violeta, sem apelar a choros e lamúrias.
Alessandra Negrini interpreta uma
Violeta magistral, acredito que sem ela o filme não teria o mesmo contexto, a expressão
de abandono, de dúvidas, incertezas do seu olhar, nos deixa perplexos a imaginar o interior remexido desta
personagem.
O filme tem no seu início grande
apelo emocional e até de suspense, perde-se um pouco no meio, mas se reencontra
no final com a música de Chico Buarque ganhando nova força poética, como a
recobrar o fôlego, a demonstrar que deu-se as costas ao antigo e está de frente
para novas descobertas que a vida está a oferecer, com as perspectivas que irão se abrir,
mesmo sem saber pra onde ir. Meio incoerente
com o decorrer do filme, mas subentendido nas entrelinhas, nos convidando a assumir novos riscos e sentir o gostinho da
liberdade pessoal.
O mar com suas ondas prateadas , horas azulado, como a demonstrar conflitos internos e novas descobertas tem grande
significado para o título do filme e na vida do personagem.
Para quem gosta de filme sensível
e introspectivo, com poucas falas e muitas expressões, vale a pena conferir!!!