quinta-feira, 16 de maio de 2013

ABISMO PRATEADO



O filme do cineasta Karin Aïnouz, conhecido pelos filmes O Céu de Suely e Madame Satã, premiado no Festival do Rio, este diretor em entrevista falou da sua vontade antiga de filmar uma história de amor falando de abandono e seus desdobramentos, inspirado na canção de Chico Buarque ¨Olhos nos olhos¨, onde o próprio diretor comenta o quanto esta música sempre o perturbou a tal ponto de amadurecer este filme com praticamente um personagem, e só iniciou o filme quando a atriz Alessandra Negrini aceitou o papel, pois só conseguia enxergá-la neste personagem sofrido e vibrante.
"Quando você me deixou, meu bem, me disse para ser feliz e passar bem / Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci, mas depois, como era de costume, obedeci / Quando você me quiser rever já vai me encontrar refeita, pode crer / Olhos nos olhos, quero ver o que você faz / Ao sentir que sem você eu passo bem demais.¨
O filme conta a história de Violeta, dentista de 40 anos, que leva uma vida ¨segura¨ entre o trabalho, a vida no lar com marido, e na ida a academia descobre pelo celular que seu marido a abandonou sem aviso prévio, com filho adolescente e apartamento recém-mobiliado em Copacabana. Sem chão, com a vida desmoronada, totalmente desnorteada, percorre as ruas de bike, onde ocorre um incidente com um carro, que no susto a leva ao chão, numa demonstração que a vida é feita de surpresas inesperadas, quando pensamos que temos controle sobre nossas vidas (como ela como dentista tinha sobre seus pacientes), nos sentimos frágeis ao sermos atingidas por uma sombra , como se perdêssemos o chão.
Neste abandono e desespero de amor a personagem desmonta totalmente, ela percorre as ruas do Rio, boates, vai ao aeroporto tentar encontrar o marido em Porto Alegre, e encontra uma menina e seu pai que passam pelo mesmo processo de abandono e ainda sem casa para morar, o que torna-se para ela um aprendizado e auto-conhecimento.O filme segue praticamente em 3 etapas, o impacto da descoberta e busca do marido, o luto da perda e a convivência da solidão e finalmente aceitar o que a vida lhe oferece a partir daquele ponto final. É um drama intimo onde tem poucas falas e muita expressão , onde o som do mar, do radio do táxi, de obras na rua, do trânsito é uma das características marcantes, como a sugerir o estado emocional de Violeta, sem apelar a choros e lamúrias.
Alessandra Negrini interpreta uma Violeta magistral, acredito que sem ela o filme não teria o mesmo contexto, a expressão de abandono, de dúvidas, incertezas do seu olhar, nos deixa  perplexos a imaginar o interior remexido desta personagem.
O filme tem no seu início grande apelo emocional e até de suspense, perde-se um pouco no meio, mas se reencontra no final com a música de Chico Buarque ganhando nova força poética, como a recobrar o fôlego, a demonstrar que deu-se as costas ao antigo e está de frente para novas descobertas que a vida está a oferecer, com as perspectivas que irão se abrir, mesmo  sem saber pra onde ir. Meio incoerente com o decorrer do filme, mas subentendido nas entrelinhas, nos convidando  a assumir novos riscos e sentir o gostinho da liberdade pessoal.
O mar com suas ondas prateadas , horas azulado, como a demonstrar conflitos internos e novas descobertas tem grande significado para o título do filme e na vida do personagem.
Para quem gosta de filme sensível e introspectivo, com poucas falas e muitas expressões, vale a pena conferir!!!


4 comentários:

  1. Gostaria de dizer que seu blog é o tíquete de entrada para o cinema. Uma leitura leve, fluida, um verdadeiro convite para se ver o filme! Parabéns pela crítica e sim, acabei de ser persuadida a ver a Alessandra Negrini, que, na minha opinião, nasceu mesmo foi para o cinema!

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    1. Meu objetivo é justamente repassar o que um expectador que adora cinema sente, e filtrar os filmes que comento, sem maiores intenções literárias. Só pelo prazer de descrever algo que gostei. Obrigado pela assiduidade e por acompanhar o blog. Insistir sempre.

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  2. Com esse comentário, rico, já entrei no clima, aliás, no filme e, sinto-me "no ar, antes de mergulhar".

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  3. Nicia, este mês farei comentários sobre alguns filmes nacionais, o próximo será Somos tão jovens e Elena. Aguarde, até breve. Obrigado pelo estímulo.

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